Polícia

'Ninguém delata ninguém, mas quem comete erro é cobrado', diz delegado em júri

Estudante, Matheus Coutinho Xavier foi executado com fuzil calibre 762 por engano no lugar do pai

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Marina Romualdo
Pai de Matheus, o "PX" se emocionou durante o depoimento (Foto: Luiz Alberto)

O júri popular de Jamil Name Filho, o Jamilzinho, Vladenilson Daniel Olmedo e Marcelo Rios está sendo realizado nesta segunda-feira, 17 de Julho, no Fórum de Campo Grande (MS). Eles são acusados pela morte do estudante de Direito, Matheus Coutinho Xavier, que ocorreu no dia 09 de Abril de 2019, na Capital.

Durante a manhã, a delegada Daniella Kades de Oliveira Garcia, que atuava na Delegacia Especializada em Repressão a Roubos a Banco, Assaltos e Sequestros (Garras) e participou da investigação da morte do jovem foi ouvida e relatou que entre os anos de 2018 e 2019, a Polícia Civil, notou onda de assassinatos incomuns na Capital. "Mortes com fuzil e veículos de incêndio. Os crimes eram muito próximos um do outro. As investigações começaram com a morte do ‘Playboy da Mansão’ [em 2018]", contou a testemunha.

As mortes foram orquestradas justamente pela família Name, envolvida com milícia e o jogo do bicho em Mato Grosso do Sul, conforme resultados da Operação Omertà, deflagrada no ano de 2019, em ação conjunta entre Garras, Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), Batalhão de Choque e Batalhão de Operações Especiais (Bope).

Já durante no período da tarde, foram ouvidos o delegado que trabalhou na força-tarefa junto do Garras, Thiago Macedo, o delegado titular da Delegacia Esp. de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), o pai de Matheus, Paulo Roberto Xavier, o PX e o escrivão da PCMS, Jean Carlos.

Jamil Name Filho, o Jamilzinho, Vladenilson Daniel Olmedo e Marcelo Rios durante o julgamento (Foto: Luiz Alberto)

De acordo com o delegado, Thiago Macedo informou que o homicídio foi algo planejado. No entanto, o alvo era para ser o PX, pai de Matheus. "Os gerentes [Vladenilson e Marcelo] recebiam as ordens e passavam para os executores, que eram José Moreira Freires, mais conhecido como Zezinho e Juanil Miranda Lima. E, que logo após o crime fugiam do local e colocavam fogo no veículos utilizados para os fatos".

O delegado da DHPP, Carlos Delano confirmou aos promotores do Ministério Público de Mato Grosso do Sul que após a prisão dos envolvidos as mortes em Campo Grande tiveram fim. O titular relembra que abriu inquérito no dia 12 de junho de 2019 para investigar homicídios que estavam ocorrendo na cidade. Porém, foi informado que teria que deixar a delegacia por ameaças e fazer parte da corregedoria. "Após um período, com a minha volta na delegacia descobri que foi tirado a pedido de Jamil Name e voltei a fazer parte da força-tarefa".

"A motivação do crime seria que Jamilzinho teria um desentendimento com o advogado paulista, Antônio Augusto de Souza Coelho. Ele e os "Name" eram rivais por conta da venda da Fazenda Figueira, localizada em Jardim (MS), que já foi palco de seita coreana do Reverendo Moon. Com isso, o "PX" foi contratado para prestar serviços para os “Jamis” e, após não fazer o que eles queriam, passou a prestar serviços para o Antônio e isso foi uma traição para família Name", explicou Delano.

No relato, o delegado da DHPP expôs que durante as investigações para concluir o homicídio de Matheus, foram analisadas câmeras de segurança que ficavam próximo a casa da vítima fatal. "Foi possível analisar que um veículo Chevrolet Onix, de cor branca, passou duas vezes pelo local e, na segunda vez, passa em alta velocidade quando é visto que pessoas saem para ver o que tinha acontecido. Em seguida, o carro com as mesmas características é encontrado incendiado em uma rodovia, na região do bairro Moreninha".

Durante as diligências, a equipe policial chegou ao hacker que foi contratado pelos "Names" para descobrir e acompanhar a localização de "PX". Foi quando descobriram, porém, assassinaram o alvo errado. Para finalizar, Delano foi indagado se "Matheus teria sido morto por uma organização criminosa?". O delegado responde que "ninguém delata ninguém, nunca. E, quem comete erro é cobrado".

Vale destacar que meses antes de ocorrer o assassinato de Matheus, Vladenilson procurou até a advogada de "PX" para saber o seu paradeiro e o mesmo foi informado que estavam atrás dele. Em seu relato, Paulo Roberto salienta que não tem medo dos réus, pois, o que tiraram dele foi bem pior. Além disso, ele narra o dia do último adeus ao filho. "Por volta das 18h, estava estudando com fone de ouvido e pedi para Matheus ir buscar os mais novos na escola. Momentos depois, escutei barulhos de tiros e a mulher que trabalhava em casa disse que era tiros. Quando sai para ver o que era, uma pessoa que estava ao lado de fora disse "atiraram no menino que está na caminhonete". Era meu filho, ele estava tirando a caminhonete para tirar o outro carro da garagem".

Paulo Roberto Xavier, o pai de Matheus (Foto: Luiz Alberto)

"Empurrei meu filho para o lado e fui em direção ao hospital. Eu conversava com ele e estava vendo que ele sangrava pela boca, nariz e ouvido. Eu dizia 'eu vou te salvar. Resista'. Mas, infelizmente, quando chegamos a Santa Casa, ele já estava sem vida e eu não sabia quem tinha feito isso com ele. No dia seguinte, Vladenilson foi até a minha casa e disse que Jamilzinho queria conversar comigo. Eu fui e ele me ofereceu R$ 10 mil. No dia ele disse 'enterra seu filho e vai embora daqui' e eu o dizia que tinha que falar com a polícia para saber o que tinha acontecido com o meu filho, mas ele dizia que eu não ia falar com ninguém", relembrou "PX".

No depoimento, Paulo Roberto ainda contou como foi contratado para trabalhar com a família Name. "Comandava a Polícia Militar de Miranda e, por conta dos estudos, fui transferido para Campo Grande e passei a comandar a região central da Capital. Na época, apreendia máquina casanik e jogo do bicho. Em 2009, uma pessoa denunciou e fiquei preso até o ano de 2011. Após um dia de ser liberado, o policial civil Vladenilson foi até a minha casa e disse que os "Names" queriam conversar comigo. Quando cheguei no local, eles me perguntaram se eu tinha aprendido a lição e fui contratado para acompanhar Jamilzinho".

Em um desses trabalhos, Jamil Filho queria ir em uma boate famosa que fica localizada na Avenida Afonso Pena e, "PX" afirmou que sempre soube que quando ele saia de casa arrumava um problema. Neste dia, o Marcel Costa Hernandes Colombo, mais conhecido como "Playboy da Mansão" pegou um gelo do balde de bebidas de Jamilzinho e teria iniciado uma discussão. Segundo Paulo Xavier, o mesmo o jurou de morte. Em outubro de 2018, Colombo foi morto a tiros de pistola 9 mm, na Capital.

(Foto: Luiz Alberto)

Execução – O estudante, Matheus Coutinho, foi executado com fuzil calibre 762 na Rua Antônio Vendas, no Jardim Bela Vista, em Campo Grande. Os mandantes do crime foram  Vlade e Marcelo Rios, Jamil Name e Jamil Name Filho.

Os criminosos acreditavam que dentro da camionete estava o pai do jovem, que seria o verdadeiro alvo dos acusados.

Matheus Coutinho Xavier foi morto por engano - (Foto: Arquivo/DD)

Operação Omertà – A Operação Omertá prendeu 19 pessoas, recolheu armas, telefones celulares, computadores, dinheiro e folhas de cheque. Entre os presos estão o empresário Jamil Name, o filho dele Jamil Name Filho, funcionários da família, policias civis, guardas municipais, militar da reserva do Exército, policial federal, dentre outros.

As investigações do Gaeco tiveram início em abril deste ano e foram instaurados com o fim de apoiar  o trabalho de elucidação dos homicídios de Ilson Martins Figueiredo, Orlando da Silva Fernandes e Matheus Coutinho Xavier, conduzido  pelo Garras desde 26 de Abril.

Desde então, as equipes do Gaeco e Garras desenvolvem trabalho em conjunto, o que propiciou, já em 19 de maio de 2019, a prisão de um dos integrantes da organização criminosa em poder de parte do armamento pertencente à mesma, sendo 2 fuzis AK 47; 4 fuzis 556; 11 pistolas 9mm dentre outros. As diligências que culminaram no encontro do armamento e prisão do membro da organização responsável pela sua custódia e administração contaram também com o apoio do Choque.

Com os 19 presos desta sexta-feira, foram apreendidas mais armas de fogo, munição, aparelhos celulares (inclusive aqueles conhecidos popularmente como "bombinhas"), computadores, documentos e aproximadamente R$ 160 mil, além de cheques em nome de terceiros.
 

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